segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

IVETE SANGALO: BONITINHA E ORDINÁRIA.


“Ordinária” no falar baiano significa “mulher sedutora, que abusa da sensualidade”. Para alguns Ivete Sangalo pode até ser esse tipo de ordinária, tem gosto pra tudo mesmo. Para mim, ela não passa de uma mulher bonitinha. E ordinária, no sentido mais grosseiro da palavra. Porque como se já não bastasse o tanto de hipocrisia que tenho de suportar durante os dias de festa em Salvador, ela, achando pouco, inventou de fazer um “protesto” em pleno carnaval: com seu trio elétrico passou por cima de cds e dvds piratas. Que rebeldia! Que atitude politizada!

(Depois do protesto, ela recebeu de sua gravadora uma homenagem por vender 250 mil cópias (originais) de seu último CD “Ivete Sangalo Ao Vivo no Maracanã”, 600 mil DVDs (originais) e três milhões de downloads (legitimados). Despreza-se contabilizar a quantidade de cópias piratas vendidas, que, decerto, tem valores numéricos simbólicos relevantes).

É engraçado como às vezes resisto em acreditar que uma quantidade tão abusiva de demência possa estar numa pessoa só e começo a achar que o demente, nem tão demente assim, faz a coisa de propósito, somente para provocar. Mas no caso da ordinária em questão, assim como seu jeito de cantar e brincar com o público são atitudes espontâneas, suas ações equivocadas e dementes sofrem da mesma espontaneidade.

No alto de sua raiva e realeza, em pleno sábado de Carnaval, Ivete Sangalo declarou:
"Se eu vir um pirata, eu caio de porrada em cima dele. A gente precisa de respeito".

Ivete Sangalo despreza o povo. Tão voltada para si mesma, esquece que jamais teria a abragência que tem – e o patrimônio que tem – se não fosse o significativo empurrão da pirataria. Se não fosse aquele mesmo povo – que a viu toda enraivada e dona de si esmagando produtos não-originais – que pagou de R$ 5,00 a R$ 10,00 por um cd ou dvd seu e, consequentemente, compareceu aos seus shows.

Detentora da verdade, o discurso da ordinária pode não ser vazio, mas, para muitos que presenciaram seu chilique, entrou por um ouvido e saiu pelo outro, porque, pensem bem, a pirataria comercializada (a do camelô) e a pirataria legitimada (a dos programas de computador: emule e cia), ambas, hoje, têm um alcance enorme na vida das pessoas, e muitas daquelas que lá estavam no bloco da Ivete, sustentando seu conforto, pagando quilos de reais para festejar 3 ou 4 dias, certamente compraram o cd ou o dvd pirata ou, simplesmente, baixaram na internet. A vibração que se viu diante da calorosa revolta da ordinária se deu muito mais pela irreverência – uma característica marcante dessa artista – da frase do que por um apoio verdadeiro, como se depois desse dia, nenhuma dessas pessoas nunca mais comprariam qualquer produto pirata e fariam panfletagem contra a pirataria em seus trabalhos, em portas de fábricas, em suas igrejas, associações de bairro e condomínios.

É muito cômodo e fácil fazer esse discurso politicamente correto, porque afinal de contas estaria a Ivete, ali, em defesa do respeito aos artistas e trabalhadores de gravadoras e lojas de discos, se posicionando contra o crime, pois já está provado que a pirataria financia o tráfico de drogas e armas.

Não há um, há dois poréns nisso tudo: se formos comparar o contingente de pessoas que trabalham diretamente com a produção de cópias originais com o montante de pessoas que vivem da pirataria, Ivete Sangalo estaria muito mais para “Lulinha, paz e amor” do que para o Lula metalúrgico do final da década de 1970. Assim como, ouvi dizer, que um tal grupo de chineses, liderado por um indivíduo chamado Law Kin Chong, lucra milhões com a pirataria sem pagar um real de impostos. Pois bem, se for assim, sou obrigado a dizer que a senhorita Ivete Sangalo é, no mínimo, cúmplice de crimes cometidos pela sua gravadora, uma vez que um disco seu custa até R$ 25,00 e um DVD chega a R$ 40,00, quando, já está sabido há tempos, que o custo de produção dos mesmos é baratíssimo e o lucro das multinacionais a cada exemplar vendido é grandessíssimo.

E por falar em sonegação de impostos, uma dona Maria qualquer, que tem a calçada de sua rua mal feita, um João qualquer que mora num bairro em que o poste não funciona, dirijam-se a Ivete Sangalo e exijam dela – e de seus tantos companheiros donos de blocos carnavalescos – o dinheiro de impostos referentes ao Carnaval que deveriam ser pagos à prefeitura e que são escandalosamente sonegados desde a gestão do Sr. Antônio Imbassahy.

Aposto um real de Big Big e perco pra ver a tal ordinária fazendo esse mesmo discurso raivoso a favor do povo no Carnaval, a favor de acabarem com blocos e camarotes, passando o trio por cima de abadás, a favor da verdadeira democratização da festa, em respeito àqueles – e não são poucos –, que mesmo esmagados por blocos e camarotes e abadás, fazem questão de ver Ivete Sangalo na Avenida, vão aos seus shows, compram seus cds e dvds piratas, baixam suas músicas e, consequentemente, sustentam sua casa, suas roupas, comida e a ração dos seus cachorros.