terça-feira, 28 de outubro de 2008

CONTRA A GOROROBA, FAÇAM-ME UMA GARAPA!


Quando o Gilberto Gil pensou na Geléia Geral – bem antes dessa fala calma e sem lógica, apenas melódica, dos discursos e entrevistas dos últimos anos – em nada tinha a ver com a grande bagunça que são as alianças partidárias em nosso país. Naquela época, a política de Gil eram cabriolas e cambalhotas sobre gravatas e paletós. E uma coisa é certa: quem ainda engatinha, obviamente, não fica em pé. A baderna partidária que vivemos serve de falsa auto-afirmação de que somos sim um país democrático, serve apenas para legitimarmos a tamanha confusão sem cabimentos nem critérios, abrindo brechas profundas para a falta de escrúpulos e consistência partidário-ideológica, pois, nessa linha de Democracia tão proferida pelos deformadores de opinião legitima-se quem um dia é oposição e numa determinada circunstância, nitidamente interesseira, torna-se situação, tal fosse essa promiscuidade um pequeno exemplar dos supostos primeiros passos de nossa vida democrática. A verdade é que ainda ralamos os joelhos no chão.


Faça-se um resumo do que gerou o resultado das Eleições Municipais deste ano: No Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PMDB) venceu – apoiado por Lula e pelo DEM que faz oposição ao Governo Federal no Congresso – o candidato Fernando Gabeira (PV) – ex-PT, que teve o apoio dos artistas e que no Congresso sabe que seu partido é aliado do Governo Federal; Em São Paulo, Kassab (DEM) – que rompeu com o PSDB, contou com o apoio, no 2º turno, do mesmo PSDB – derrotou, humilhou Marta Suplicy (PT); Em Belo Horizonte, o mesmo PSDB, digamos, mais flexível, foi o fundamental aliado de Márcio Lacerda (PT) para derrotar Leonardo Quintão (PMDB), que sabe, como todos sabem, que seu partido é base do Governo Federal; Em Salvador, João Henrique (PMDB) – abraçado a Lula, de mãos dadas com ACM Neto (DEM), que é oposição ao Governo Federal – apagou a estrela de Pinheiro (PT) – de mãos dadas com Lula e agarrado a Imbassahy (PSDB) e Raimundo Varella (PRB), no 2º turno (este último esteve com ACM Neto no 1º turno, mas debandou contrariamente na 2ª fase das Eleições). Sem falar nos pequeninos repartidos partidos – PP, PR, PSL, PHS, PSDC, PMN, PT do B, PTC, PPS, etc. – que vão de uma ponta a outra, buscando a melhor sombra para sobreviver.


É a isto também que os Alexandres Garcias, os Ricardos Boechats, os Mários Kértezs e as Mirians Leitões chamam de Democracia. Mais que isso, imbecilmente, estes deformadores de opinião comemoram a cada Eleição esta farsa, como se a farra e repartição infindável do pensamento partidário no Brasil fosse um grande avanço para nossa sociedade, um grande avanço na construção democrática do país.

É preciso paciência, há tempos ansiamos por um regime democrático duradouro, pois o Brasil ainda é novo nesse negócio de Democracia, recomeçamos outro dia, pois foi outro dia que trouxemos Fernando Collor ao poder – um exemplo nítido do quão despreparados estávamos. Antes disso, vivemos décadas de Ditadura, tendo experimentado ligeiro espaço de tempo democrático (Jânio, JK, Jango), sem contar com o poder estabelecido, anos infinitos antes, por Getúlio Vargas, ora mandando – Estado Novo –, ora dialogando – curto período democrático, que culminou no suicídio do líder. Fora isso, o que vem antes do Pai dos Pobres não tem nem cheiro de Democracia.

Não estou aqui dizendo que não vivemos nem que não devemos viver democraticamente. Pelo contrário, estou corrigindo, deixando claro que não é este fogaréu de partidos que vai fortalecer nossa Democracia. Muito menos essas alianças descabidas são o melhor exemplo de se viver verdadeiramente uma vida democrática. Decerto, esse fogaréu confunde, ameaça sensivelmente a tomada de idéias e práticas viáveis, pois a partir do ponto em que não se estabelecem majoritárias correntes de pensamento político, perde-se a chance de resolvermos efetivamente os problemas da vida sócio-econômica, fazendo com que essa enxurrada de partidos não passe de um grande conglomerado de pequenos cartéis, fontes burocráticas de interesses exclusivamente financeiros.


Ao sugerir este estreitamento não estou de forma alguma justificando a manutenção, ainda teimosa, de uma visão maniqueísta partidária, como se tivéssemos que, burramente, outra vez, dividir o país em meros comunistas de um lado, expressivos capitalistas do outro. O século passado passou, mas restam ainda teimosos cadáveres que às vezes alteram voz e discurso em minúsculos soviéticos palanques. Creio que é preciso achar o equilíbrio necessário, é imprescindível que os posicionamentos dos partidos tomem tendência real e transparente, ou melhor, é fundamental a derrubada de determinados partidinhos e que haja o crescimento e amadurecimento estrutural e espiritual de partidos verdadeiramente influentes.


Vejo o exemplo dos Estados Unidos. Não por acaso o amadurecimento explícito da Democracia Estadunidense, pois lá, de verdade, existem apenas dois partidos: Democratas e Republicanos. E não são opostos, absolutamente opostos, possuem pontos de vista diferentes. Nessa hora entram outros deformadores de opinião, foices e martelos em punho, para negar a existência de Democracia nos Estados Unidos. Além de ser uma opinião baseada no ranço da inesquecível Cortina de Ferro, há uma visão deturpada sobre o assunto, pois lá, num país que jamais viveu anos de chumbo, é que as definições ideológicas, podendo não ser as mais eficientes, são, em absoluto, concretas e bem estabelecidas. Não é mesmo por acaso o fervor e participação ativa de toda a sociedade estadunidense ainda nas prévias das Eleições presidenciais.

Mesmo sem saúde e fisiologia adequada, eu fico com as cabriolas e as cambalhotas, pois, num país onde Frank Aguiar é deputado federal, Léo Kret é vereador(a) e Netinho de Paula é comunista, melhor a bem intencionada Geléia Geral do Gil do que esta existência frágil da gororoba, que, no Brasil, insistimos chamar – de boca cheia – Democracia.